E porque hoje, a modos que estou virada para os sentimentalismos, cá vai um textozinho da Margarida Rebelo Pinto, (de que gosto particularmente e com o qual me identifico) que poderia ter sido escrito por mim se tivesse o jeitinho para a escrita da dita Sra, e depois tb eu poderia escrever livros e isso...
Bem , mas vamos ao que interessa.
"Boa tarde a todos, sejam bem vindos a mais uma reunião de D. A’s. Todos aqui estamos nas mesmas condições, todos passámos pelo mesmo..."
Já imaginei esta cena pelo menos vinte vezes. Nós, os divorciados, devíamos ter um centro de assistência, um clube, uma associação, uma sociedade recreativa tipo Alunos de Apolo sei lá, qualquer apoio de qualquer tipo como os AA’s e os NA’s, porque isto de uma pessoa se ter casado e depois ter desistido de continuar por ali não é pêra doce.
Mas não. Uma pessoa divorcia-se e mesmo que esse seja o dia mais feliz da sua vida – uma amiga minha entrou numa perfumaria e comprou um frasco de perfume só por causa do nome Happy, tal era o entusiasmo – aquilo que nos espera e uma mistura entre um jogo do 007 de Play Station e uma travessia do deserto. E NINGUÉM percebe, a não ser que esteja a passar pelo mesmo. Ninguém nos liga nenhuma. Toda a gente nos dá pancadinhas nas costas e nos diz é pá, isso vai-te passar num instante, como se estivéssemos com uma constipação. Mas um divórcio tem mais a ver com um fundo alérgico permanente do que com um estado inflamatório agudo. Primeiro, porque numa reacção condicionada, ficamos alérgicos ao casamento. E depois, porque as pessoas ficam alérgicas a nós. E ficamos de fora nos jantares de casais, nas férias de casais, nos fins de semana de casais. Somos um número ímpar, que não serve para nada, nem para desempatar. O mundo está pensado a dois, quase tudo funciona aos pares, desde a volta da Roda Gigante até aos prémios me viagens. No Natal sentimo-nos avulso e nos casamentos sentimo-nos deslocados, olhamos para os noivos e pensamos secretamente: coitadinhos, ainda há de chegar o vosso dia.
Mas nem sempre tudo é mau. Se uma pessoa se divorcia, em princípio, é para se ver livre de um chato ou de uma chata qualquer. É para mudar de vida, e quando se muda, espera-se em princípio, é para se ver livre de um chato ou de uma chata qualquer. É para mudar de vida, e quando se muda, espera-se que seja para melhor. As mulheres encurtam as saias, vão para a ginástica, pintam o cabelo e passam a guiar com a música aos gritos e a janela do carro aberta, porque, citando um amiga minha que é uma sábia nestes assunto do coração, o príncipe está em toda a parte. E eles, os sapos candidatos a príncipes que regressam à arena, alugam um apartamento pequeno numa zona in, adquirem uma aparelhagem XPTO e um sistema de TV,DVD Video & Colunas Sensoround Inc. e compram um descapotável. É um clássico. Os que não andavam no ginásio, inscrevem-se e os que já andavam começam a colar o nariz ao vidro da aula de localizada, cheirando, como se diz no Alentejo. E, depois de um período de tristeza e neura, recomeça a caça. Já sabem o que penso deste assunto: o homem caça e luta, etc, etc – bolas, já devia andar a pagar direitos de autor ao Michelet, ando sempre a citá-lo – e a tourada recomeça.Há várias maneiras de entrar na tourada. Por isso, antes de entrar na arena, é melhor escolher que papel é que se vai ter em campo. Ele há os peões de brega que servem para colocar o bicho para o toureiro principal, ele há os toureiros a pé, ele há os cavalos, os cavaleiros e o próprio bicho. Eu prefiro guardar-me na sombra, a assistir de camarote ao espectáculo, enquanto pisco o olho ao Inteligente, mesmo que ele tenha pouco jeito para tocar a corneta. É que quem vai a guerra dá e leva e nem com capacete e cota de malhas um ingénuo e bem intencionado mortal se livra de levar umas cornadas. Claro que também, como aliás em tudo na vida, é uma questão de sorte. É melhor um touro bravo e resmungão mas leal e com uma investida clara do que um mansinho que baixa a cabeça a bate o pé – neste caso a pata – mas que nos colhe na curva ,isto é, de cernelha, enganando-nos com mutações de carácter. Se nos sai um touro na rifa, é melhor ter pedigree, ou seja, sabermos de onde vai e para onde vai mesmo que o próprio, numa fase de momentânea desorientação, esteja muito excitado com o barulho das luzes e ande a marrar a torto e a direito. E muita atenção aos ferros no lombo; os curtos e grossos são os que doem mais. Até porque quando a luta tiver acabado, aparecem logo não sei quantas vacas – ou bois - com vocação para lamber as feridas da vítima.Chega de metáforas taurinas que o assunto é sério. Até porque há quem nunca levante a cabeça e saia definitivamente da pseudo penumbra pós traumática de ter a abreviatura Div. no BI. Porque é que não imaginam que Div. também pode ser abreviatura para divertido, diversificado, diversão? Os ex inconsoláveis são a raça mais chata do mundo, porque ou ficam neuróticos e incapazes de se entusiasmar com qualquer outra pessoa, ou decidem vingar-se no próximo ou próxima o mal que sofreram. Nestes casos, o melhor é guardar distância e esperar que lhe passe a estupidez. A alguns nunca passa, mas isso é problema deles. E depois há aqueles que gostam imenso de se casar e por isso não descansam enquanto não encontram um para que também goste de praticar o mesmo desporto. Os que gostam de se casar estão sempre safos, porque como geralmente as mulheres também ligam muito a estatuto, encontram com facilidade uma consorte. Mas estes são poucos, porque uma coisa que se descobre depois de levar com o carimbo do div. no BI é que se pode namorar até ao fim da vida, sem ninguém ter que se casar outra vez. Só a trabalheira que dá, a festa, os convites, a roupa, a data, a lista, não compensa o esforço. Até porque quem casa segunda vez não se pode ter esquecido do trabalho que deu o divórcio. E quem é que disse que o casamento é o primeiro passo para o divórcio? Um cínico qualquer que também era lúcido.Se a vida te dá limões, faz limonadas. Isto foi o que me ensinou uma amiga minha que já fez imensas limonadas com os limões que o marido lhe foi dando ao longo da vida. Quando lhe perguntei porque é que com tanta tourada nunca se tinha separado, respondeu que não valia a pena porque eram todos iguais e além disso ela achava que ele era a metade da laranja dela. E não pensem que se trata de uma engenheira agrónoma, gosta é de fruta. Esta conversa da metade da laranja sempre me deixou um bocado confusa. É que hoje em dia somos tantos biliões, como é que eles lá em cima têm tempo para separar as almas? E se a minha metade estiver em Laos, tiver a pele amarela, um metro e vinte e nove a trabalhar na apanha do arroz? Agora a sério, depois do divórcio fica-se com um certo medo de não voltar a acertar. E por isso, na maior parte das vezes, é melhor não arriscar. Estar casado não é um estado civil, é um estado de espírito e estar divorciado que é como quem diz, solteiro, também é. Até porque como hoje deve haver mais divorciados do que casados, o estigma já é muitas vezes ainda estar casado. As pessoas perguntam por um amigo que não vêm há anos: fulano de tal ainda está casado? Como se se tratasse de um feito histórico com direito a condecoração. O exercício que se propõe aqui é o seguinte: uma pessoa tem ou não feitio para estar casada? Uns sim, outros não. E os que não têm, não devem ser dementes e repetir os mesmo erros à espera de resultados diferentes. O problema é que os homens, que pensam que não têm, quase sempre não passam sem uma mãezinha que lhe ponha a vida em ordem. E as mulheres, mesmo as mais independentes, sentem a falta de alguém que lhes aconchegue os lençóis à noite e pendure os varões das cortinas novas do quarto das crianças. Resumindo e concluindo, se calhar andamos todos a brincar à pessoas autónomas, quando no fundo no fundo adorávamos encontrar alguém que gostasse mesmo de nós e para quem nós fossemos mesmo importantes. A tal cara-metade ou metade da laranja que às vezes nos sai cara. Vai uma limonada?
terça-feira, setembro 26, 2006
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3 comentários:
É longo mas vale a pena ler. E as últimas linhas dizem tudo! No fundo só queremos amar e ser amados. E amar até é facil, dificil é não complicar.
Gostei muito!
E, apesar de andar farta de pensar sobre o pensar sobre o pensar, fez-me pensar...
Beijinhos!
affzzz
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